Em entrevista para o IHU On-Line, em janeiro deste ano, o geógrafo Ariovaldo Umbelino, chefe do departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), defende a reforma agrária no Brasil e afirma que ela “faz parte do processo de diminuição da violência que existe no campo”. Leia alguns trechos da entrevista.
IHU On-Line – Existe ainda, no Brasil, uma questão agrária? A reforma agrária ainda é uma necessidade?
Ariovaldo Umbelino – Ainda está em jogo o processo produtivo, de um lado, e a questão da propriedade privada da terra, de outro. Se analisarmos exclusivamente da ótica do processo produtivo, poderíamos dizer que não há uma questão agrária no Brasil porque não é um país que depende de importação de produção de alimento.
Mas, quando analiso a questão agrária, na perspectiva da formação da propriedade privada da terra no Brasil, penso que ela existe sim, ou seja, cerca de 1/5 das terras no Brasil foram cercadas por pessoas que não têm documentos hábeis legais para deter o controle dessa propriedade da terra. Além disso, há um grande número, que podemos classificar como posseiros, que, pela legislação brasileira, têm direito à legitimação dessa área que ocuparam e que, por direito, deveriam ter essa correção do ponto de vista da propriedade privada da terra no Brasil. Mas as médias e grandes propriedades não têm esse direito. Isso quer dizer que a questão fundiária não está resolvida.
Por outro lado, o Brasil possui os maiores latifúndios que a humanidade já registrou, ou seja, não há limite para o tamanho das propriedades do país.
Além disso, há a presença no país de movimentos sociais de luta por acesso à terra. Simultaneamente à luta desses momentos sociais, há uma parte do campesinato sem terra no Brasil que abre luta através da abertura de novas posses. Portanto, existe uma questão agrária, a questão fundiária não está resolvida, assim como um processo de luta. A questão da reforma agrária é atualíssima e faz parte do processo de diminuição da violência que existe no campo exatamente porque não está resolvida.
IHU On-Line – Como esse processo deveria acontecer para que o problema de distribuição de terras fosse sanado?
AU – A Constituição Brasileira é clara, límpida. A propriedade privada à terra está subordinada a sua função social. Ou seja, está submetida ao seu uso produtivo e ao fato de essa produção seja feita respeitando as leis trabalhistas e as leis ambientais. Nós temos no Brasil hoje, do ponto de vista das grandes propriedades, 120 milhões de hectares de grandes propriedades, as quais, no cadastro do Incra, já estão identificadas como improdutivas. Ao mesmo tempo, há, no Brasil, cerca de 250 milhões de hectares de terras apropriadas indevidamente.
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